Quando Tarja Turunen descobriu que estava grávida, a família não considerou por um segundo que a cantora parasse sua tour.
“A felicidade da criança é o mais importante. Eu espero que Namu se adapte ao nosso estilo de vida, pois sem minha carreira eu me tornaria uma pessoa terrível”.
Em Kitee, no jardim de uma casa cinza-azulada, a neve forma um manto fino. As únicas pegadas levam á porta de entrada, á lanternas, e, ao seu lado, ao Lobby lotado de malas de viagem. Algumas ainda têm flocos de neve nelas.
As malas viajaram da Argentina á Alemanha, de lá até Helsinki e por fim até North-Karelia. Tarja Turunen, 35, e sua família chegaram ao seu destino apenas alguns momentos atrás. Estamos na casa do irmão da cantora: a casa de Timo, Minna e suas duas princesinhas. Aqui a família se reúne para celebrar o Natal, e desta vez com um novo membro entre eles.
Naomi Erika Alexia Cabuli Turunen está com pouco mais de quatro meses e é a sua primeira vez no local de nascimento de sua avó, na Finlândia Oriental. Na Argentina, berço de seu pai, Marcelo Cabuli, 43, é comum dar á criança um ou dois nomes, mas Naomi têm três, dois sobrenomes e um apelido: Namu.
“Graças á Deus foi uma menina, nós não tínhamos nenhum nome de menino” diz Tarja rindo e afagando os cabelos castanhos de Namu.
A garota, no colo do pai, olha seus admiradores com os olhos escuros. O médico previu que eles eventualmente se tornem verdes. Marcelo não tem problemas com isso: ele acha que os olhos castanhos da filha causariam á ele ainda mais cabelos brancos e preocupações em afastar os namorados.
“É sempre bom voltar a Kitee, mas dessa vez parece mais especial. Meu irmão foi mais rápido em ter uma família e sempre me disse que um dia eu entenderia como era. E é realmente maravilhoso” Conta Tarja.
A benção de um bebê no tempo certo
Tarja e Marcelo estão juntos há 12 anos, casados há quase 10. Marcelo tem dois filhos, um de 17 e um de 19.
“Os meninos tem sua mãe e ninguém vai substitui-la, mas eu tenho um relacionamento muito próximo das crianças. Quando eram pequenos eu costumava segurar suas mãos ao andar pelas ruas e eles vinham dormir próximos á nós á noite. Apenas alguns anos atrás não estava claro para mim se teria meus próprios filhos” Diz Tarja.
A ideia de uma família maior surgiu só no ano retrasado, quando Tarja começou a sentir falta de uma criança sua.
“Eu senti uma clara mudança no modo em como me sentia. Comecei a ver bebês por todos os lados. E eu pensei que nós devíamos tentar. Marcelo é oito anos mais velho, e isto é um dos motivos pelo qual eu não queria adiar essa decisão.”
Tarja e Marcelo passam às vezes o ano todo em Tour, e uma criança muda tudo. O bebê foi planejado com calendários em mãos.
“Nós fizemos planos para o futuro. Se eu engravidasse com facilidade, o bebê nasceria entre as tours. Mas nunca se sabe com este tipo de coisa. Tivemos sorte e conseguimos logo”.
O começo da gravidez Tarja passou em uma turnê de rock. Ao fim desta ela já estava com cinco meses e esperava para saber quando náuseas iriam começar a afetar suas performances.
“Eu fico enjoada com facilidade. Quando dirigimos pelas montanhas Marcelo tem que encostar assim que eu começo a ameaçar vomitar. É incrível que durante a gravidez eu não tenha tido enjoou um único dia” Tarja comemora.
O casal contou sobre a gravidez para aqueles mais próximos, mas não teve a intenção de manter a gravidez ou a criança em segredo. Nem os fãs nem a mídia notaram a barriga de Tarja. Somente uma semana antes do parto ela estava fazendo compras para o bebê e dando autógrafos sem nenhuma agitação.
“Só um fã no Brasil notou o que estava acontecendo. Ele(a)veio me agradecer pelo show e disse ‘você está grávida’. Eu fiquei um tanto pasma e disse que só tinha comido pizza demais” Tarja conta, rindo.
Manter a criança em segredo virou uma piada para os fãs de Tarja. Eles se perguntavam se as noticias realmente viriam à tona só na Finlândia. A notícia se espalhou no começo de dezembro quando Tarja postou um foto do bebê em sua página do facebook.
“Os fãs ficaram chocados de maneira positiva. E a quantidade de presentes que Namu ganhou deles...” Diz Tarja “ Tem em uma mala de um fã francês um vestido estampado com as renas do papai Noel puxando o trenó. Talvez Namu o use quando reunirmos a família para o Natal”.
Avós, avôs e comida enlatada.
A casa em Kitee é espaçosa e cheia de sentimentos. A mesa acomoda muitas pessoas e o Natal fica ainda mais longo. Em seu máximo, a mesa já acomodou 18 pessoas e absolutamente todo ano há uma caçarola de batatas da Karelia* cozidas e adoçadas, mas nunca Lutefisk**.
As tortas da Karelia são encomendadas de uma senhora já aposentada conhecida, e o próximo lote terá 500 delas.
Há muitos na família Turunen. No lado da mãe, só há o tio. Quando Tarja e Timo se encontram na cozinha, há um longo e apertado abraço. Os irmãos discutem cômoda e calorosamente. Ás vezes o irmão provoca a irmã sobre seu traseiro e logo a chama de Tarja-Love.
A mãe de Tarja morreu de câncer aos 53 anos, mas está nos pensamentos da família todos os dias. A mãe sorri em Kitee em uma foto com uma vela queimando na frente desta. Tarja e Marcelo tem uma igual em sua casa em Buenos Aires. É comum Marcelo acender a vela na frente de Tarja.
“Eu tive que ficar um pouco triste ao pensar em quão felizes são estes que tem os avós na família para ajudar e apoiar. Minha mãe sempre foi uma amiga importante para mim e eu queria dividir ser mãe com ela. Há um grande vazio quando minha mãe não está aqui. Parte de minha vida foi embora com ela”.
Mas felizmente há o avô. Na sala, o pai de Tarja segue as crianças e balança a cabeça quando uma esvazia o cadeirão de Namu e o enche com os próprios coelhinhos. A outra se livrou de seu vestido e corre pela sala só com as calças.
“Eu funciono com mulheres” pensa o avô.
Os avós de Namu na Argentina também estão animados. Depois que o bebê nasceu, o avô jura que ganhou alguns anos a mais em sua vida. Eles já estão mais velhos, portanto não podem ajudar a cuidar de Namu.
“Minha sogra já me disse que você tem que fazer toda a comida para o bebê você mesma. Já que comida enlatada não serviu para alimentar o Marcelo, não deveria servir para alimentar Namu. Eu explodi com Marcelo sobre quanto mais drogas de conselhos nós teríamos que aguentar, mas ela tem se controlado”.
Tarja e Marcelo têm amigos, mas no geral são só eles no dia-a-dia. Sempre foi assim.
“Nós sempre estivemos muito sozinhos nesta vida. Nossa vida é tanto na estrada. Pode-se dizer que só temos a nós mesmos, e agora a Namu”.
Tarja notou que uma criança levanta novas preocupações.
“Eu me preocupo mais com Marcelo. Eu peço que ele dirija com segurança mais vezes. Nós já falamos sobre como seria se algo acontecesse á um de nós. Eu me preocupo ao pensar em quão terrível seria ter que ficar sozinha, mas Marcelo sempre diz que eu conseguiria”.
O fato de ele ser realista e calmo é sua maior diferença com Tarja. A personalidade latina está lá, mas é mais comum ver Marcelo acalmando Tarja do que o contrário.
“Ás vezes eu tenho estas liberdades artísticas e explodo. Ou às vezes eu entro em pânico de tal maneira que não consigo nem pensar direito. Quando em pânico eu não consigo nem vestir uma calcinha certo, mas Marcelo nunca perde a calma. Ele é o trem indo na direção certa quando eu perco o caminho.”
Da incubadora para a fila da escola
Um barulho vem da cozinha. Namu está sendo alimentada com leite engarrafado no colo do pai enquanto com a outra mão Marcelo lida com seus e-mails. Tarja acha engraçado como eles no inicio se preocupavam sobre se Marcelo se lembrava de como era cuidar de um bebê. Ele havia pensando nisso ele mesmo, afinal, fazia tanto tempo desde o nascimento dos meninos.
Tarja elogia o “extremamente bom” treinamento de parto do hospital alemão em Buenos Aires. Lá, eles se sentaram juntos na aula teórica e Tarja foi ás aulas de ginástica para mães.
“Marcelo estava achando tudo aquilo um tanto engraçado, mas foi comigo sem maiores protestos. Ele estudou em uma escola médica, então estava entretido com a parte anatômica de tudo enquanto eu aprendia palavras de bebê em espanhol”.
Namu nasceu um mês mais cedo, pesando apenas 2,2kgs. Nos primeiros dias ela recuperou sua força em uma incubadora, e a família se acostumou com a pequena no hospital por um pouco mais de tempo. O começo inesperado assustou Tarja no começo, mas hoje ela acha que foi um bom timing.
“Nós tivemos mais tempo para conhecer Namu antes de sair em tour. Os meses em casa foram ótimos para nos acalmarmos, nós ficamos em paz. O mais importante é que ela esteja saudável”.
Tarja não pensou em parar de trabalhar para ficar em casa com o bebê em momento algum. Na argentina, as mães retornam ao trabalho apenas quatro semanas depois do parto. Para a maioria é por causa do dinheiro. Não há sistema de suporte e a vida é difícil. Por outro lado, Tarja diz que sente que morreria sem música.
“Se eu tivesse que abandonar minha carreira eu me tornaria uma pessoa terrível. A música me mantém viva e sem ela eu não seria feliz. E se eu sofro, a família sofre. Nós falamos que Marcelo vai ficar em casa quando ela for para a escola”.
Na argentina você vai para o jardim de infância aos dois anos de idade, e muda para a escola aos seis. As escolas particulares mais populares precisam que uma vaga seja requisitada assim que o bebê nasce. Namu já foi vista por algumas escolas inglesas.
Religião é outra parte grande de se criar uma criança. Namu crescerá com muitas religiões já que seu avô é judeu, sua avó é católica, Tarja é luterana e Marcelo não se sente realmente parte de nenhuma religião. Na vida desta nova família religião já não importa tanto, e Namu poderá escolher no que acreditar.
“A infância de Namu será de muitas formas diferente da minha. Estou um pouco preocupada que ela não vai ter um jardim como esse e natureza á sua volta para brincar. Temos que começar a dar as mãos já na porta de entrada”.
Tarja planeja ensinar á filha o que é ser Finlandesa. A natureza, o mar e a língua serão feitas familiares. Marcelo não vê problemas com isso, já que ele preferiria viver aqui enquanto Tarja gosta das cores da grande cidade.
“Sua rede social será diferente das crianças vizinhas, já que muitas delas nunca sairão do país ou aprenderá outras línguas. Por outro lado, ela terá que se acostumar a mudar de cenários e de amigos.”
Tarja se diz uma mãe firme, mais dura do que Marcelo.
“Caso contrário, nós teríamos os mesmo valores. Uma criança pode ser uma criança, brincar e brincar enquanto os limites estiverem bem claros. Uma criança tem que ser ouvida e ela tem direito a sua opinião”.
“Eu espero que ela encontre uma paixão, algo com que se anime. Espero que sejamos pais tão encorajadores quanto minha família foi”.
Os pais de Tarja a levavam para praticar hobbies cinco vezes por semana.
“Por outro lado, nós fomos ensinados a valorizar trabalho. Você podia ter sonhos, mas tinha que trabalhar duro por eles. Eu detestava ter que acordar as sete da manha para colher morangos no quintal, mas agora dou valor a isso”.
Casa em maio
Tarja trabalha agora na Finlândia também, bem perto do Natal. A tour Christimas in heart vai de Rovaniemi até Espoo até dia 22 de dezembro.
“No Natal você canta sobre coisas importantes e boas. Quando eu tenho o poder de dar á pessoa um momento de paz no meio do caos eu me sinto bem também”.
Em turnês de rock Tarja canta até duas noites em seguida e depois há uma noite de descanso. Na turnê natalina é diferente: há um dia de descanso depois de dez dias de shows, e a família o passará dirigindo de Rovaniemi até Pori. Tarja e Marcelo se revezam em dirigir e cuidar da chupeta.
“Eu não me preocupo em como faço isto. Antes do tour tive tempo de cuidar de mim mesma. Cantei muito, comi bem, fui á academia, nadei, e relaxei em casa com o bebê. Foi um tratamento especial”.
Em janeiro a família deve voar até Miami, Caribe, Los Angeles e Texas para a produção do próximo álbum de Tarja. Depois das gravações eles começarão a tour do Beauty and the Beat na Europa. Tarja conta em estar em casa pela metade de maio.
“Nós gostamos da vida em tour e esperamos que Namu aprenda a gostar disso também. A coisa mais importante é a responsabilidade de ter uma criança, mas acho que conseguiremos dar um jeito. Eu penso muito em o que faz uma boa mãe e como eu posso ser assim para Namu”.
Tarja não leu nenhum livro sobre como criar filhos. Ela não acredita que a verdade esteja por detrás das capas.
“Nós com certeza cometeremos erros como pais, mas temos as mentes saudáveis e acharemos nosso próprio jeito de sermos pais. Felizmente eu estou cada vez mais relaxada e certa de minhas ações. Sinto-me segura quando Marcelo sempre me diz que sou a melhor mãe para a minha filha”.
Notas de tradução:
*Karelia: região que se divide entre a Finlândia e a Rússia, de grande importância histórica tanto para os finlandeses, quanto para os suecos e para os Russos.
** Lutefisk: Prato típico da Noruega, comum tanto nos países nórdicos quanto nos estados Unidos que consiste de um peixe (branco) no qual a preparação leva soda cáustica ou hidróxido de potássio.
Tradução: Julia N. Hamermesz