A poucos dias de sua visita ao nosso país no começo de sua turnê européia para a apresentação de seu último álbum, "Colours in the Dark", a venerada vocalista finlandesa concede a Jason Cenador uma entrevista a partir de uma remota ilha no Caribe. A conversa se desenvolveu em inglês, devido ao fato de ela estar há vários meses fora da Argentina, e nela afloram assuntos tão diversos como a sua iminente incursão em cenários ibéricos, seus projetos paralelos ou suas perspectivas sobre os últimos movimentos da banda que a impulsionou para cima e da qual foi expulsa há anos: Nightwish.

Você está na Europa ou na Argentina, no momento?
"A verdade é que estou em uma ilha do Caribe (risos). É um luxo, mas estou trabalhando, em poucas horas entro no estúdio. É um lugar maravilhoso, nos divertimos mas trabalhamos."

Em que exatamente você está ocupada em um lugar tão idílico?
"Naomi (Nota do revisor: sua filha) está crescendo muito rapidamente. Tem quase um ano e meio e está correndo por aqui, nos alegrando a cada dia. Sabe o que aconteceu? Preciso contar. Fomos ver um filme pela primeira vez no cinema e, ainda que não tenha nem um ano e meio, ficou sentadinha por várias horas, completamente calada, por todo o filme. Ninguém podia acreditar, é um bebê! Quanto à música, estou trabalhando em meu projeto paralelo chamado Outlanders. Estou com um amigo meu, o produtor alemão Torsten Stenzel, e se trata de um projeto de música eletrônica." (NdR: Torsten Stenzel é o DJ, morador da ilha caribenha de Antígua, com quem trabalhou Mike Oldfield em seu último álbum, "Tubular Beats". Em sua única canção inédita, "Never Too Far", Tarja Turunen colaborou graças à sua amizade com o produtor alemão).

Você poderia nos falar mais sobre a natureza deste novo projeto paralelo?
"É uma coisa completamente diferente para a qual compus muitas canções. Há muitas minhas, outras que são de Torsten e também há algumas versões e várias loucuras. É uma música muito silenciosa, será um disco muito chill out (Nota do Tradutor: "para relaxar"). Será eletrônico quase que por completo, o único elemento de rock é um violão clássico tocado como solista ao estilo dos anos 80 e 90. Vou contar com guitarristas realmente importantes neste álbum. Além do mais, usarei a minha voz como instrumento também, não só como cantora principal, e farei coisas raras com ela."

Você arrisca uma data para o lançamento do álbum?
"Como é um projeto muito pessoal, não tenho pressa, vamos passo a passo com ele à medida em que vai surgindo. Será editado através de uma gravadora, claro, mas ainda não temos data, ainda que esteja certo que não será neste ano. Talvez no próximo."

Já que falamos deste assunto, em que ponto está o seu outro projeto, chamado Beauty and the Beat?
"Também continuamos trabalhando com ele. Se trata de um projeto conjunto com Mike Terrana e uma orquestra sinfônica, além de um coro. Mike é "A Batida" (The Beat)... Bom, ou "A Bela"! (Beauty) (risos). Já fizemos concertos com ele pela Europa e América do Sul no ano passado. Também gravamos um DVD na República Tcheca, que começará a ser vendido neste ano, daqui a poucos meses. É uma vertente nova da minha carreira musical que me entusiasma muito e tem sua base na música clássica.

Você esteve fazendo turnê na Finlândia no final do ano passado e agora está no Caribe, antes de embarcar em uma iminente turnê européia. Você vai sentir falta do verão argentino?
"Sim, de fato, sinto falta da minha casa na Argentina, faz quatro meses que não vou lá e desejo voltar. Adoro Buenos Aires, sinto essa cidade como meu próprio lar. Por outro lado, estou tremendamente empolgada pela turnê que está para começar e para visitar a Espanha novamente. Aí tem muitos amigos e fãs com os quais devo me reencontrar, e isso me deixa muito feliz."

Quais são as suas sensações a esta alturas dos concertos que você vem realizando até o momento, e como estão funcionando ao vivo as músicas do seu disco mais recente, "Colours in the Dark"?
"Começamos a primeira turnê Européia em outubro do ano passado e era a primeira vez em que tocávamos estas músicas. Foi muito refrescante tocá-las e me diverti muito no palco com minha banda. As novas músicas funcionam muito bem, as pessoas se entusiasmam e é fantástico observar a sua reação quando as escutam pela primeira vez. Desejo me juntar novamente com o Mike (Terrana), hoje (21 de janeiro) é seu aniversário, ligeui para ele hoje para dar os parabéns e ele também estava com vontade de trabalharmos juntos e voltar à estrada."


O que você pode adiantar sobre o repertório do qual disfrutaremos em seus shows na Espanha? Suponho que haverá variações com respeito ao do ano passado.
"Será pelo estilo. Temos muitas músicas entre as quais escolher, o que nos deixa muito felizes. Temos três discos e muitas combinações possíveis, não é como nos começos, em que só havia um álbum e não havia tanto de onde escolher. Agora tenho muita liberdade para isso, ainda que seja claro que quero tocar muitas canções do novo álbum. Também haverá uma boa seleção do resto dos trabalhos e algumas coisas interessantes que estamos preparando, claro."

Entre elas canções do Nightwish e covers, talvez?
"Talvez, talvez! (risos) Sempre tenho o desejo de surpreender os meus fãs, desde cedo, e quero passar um bom tempo com eles. Isso é o que eu mais gosto em ser artista, ter uma boa relação com quem me segue, e isto é o mais importante. Sinto muito não poder revelar mais, já já veremos o que vai acontecer! (mais risos)."

Você gosta de dividir o protagonismo com os músicos que te acompanham ou prefere exibir um certo papel de domínio?
"Está claro que os músicos com os quais trabalho são músicos contratados, mas a maioria deles vem trabalhando comigo há muitos anos. Exceto pela baixista italiana Anna Portalupi, que toca comigo pela primeira vez, o resto dos músicos esteve comigo por vários anos e nos conhecemos muito bem. Somos bons amigos e eu curto o talento deles, de verdade. Também gosto de suas personalidades, nos divertimos muito trabalhando juntos. Por tudo isso, quero dar a eles espaço quando há espaço para dar. Mike Terrana tem o seu próprio solo quando tem tempo para ele, assim como o resto dos músicos. Também é bom para mim descansar quando dá, e sei que posso dar esse papel a eles com total confiança."

Você acha que sua voz evoluiu ou talvez que tenha se enriquecido nos últimos anos?
"Mudou muito, porque estou trabalhando muito e estou cantando mais do que nunca nestes últimos anos. Estou treinando muito a minha voz e trabalhando muito, agora posso cantar em tons de soprano mais agudos, falando da minha faceta clássica, e isso me ajudou a me sentir mais livre em minhas atuações, já que minha voz ficou mais flexível. Minha professora de canto, Marta Blanco, fez um trabalho impressionante comigo, me impulsiona muito."

Muita gente acha que é mentira que uma vocalista tão aclamada como você continue contando com os serviços de uma professora de canto!
"É realmente necessária para mim; é muito, muito importante. A cada vez que volto a Buenos Aires, a visito umas tantas vezes por mês, porque é fato que preciso dela e que sempre melhoro quando estou com ela. Há muito trabalho a ser feito comigo, acredite! (risos) Não há nada perto da perfeição neste sentido, é algo de que sempre vou me lembrar, assim como o fato de que sempre há o que melhorar."

Com certeza, é bom para um artista não confiar demais nos louros e nem acreditar que tudo está feito.
"Com certeza. Se chegará esse dia em que eu pensarei que tudo foi feito e que não há nada novo para mim, deveria me esquecer da música e começar algo novo, virar cozinheira ou algo assim (risos)."

A cozinha é a sua outra paixão?
"Amo cozinhar, mas acredito que nunca vou virar cozinheira, não tenho o talento necessário (mais risadas)."

Há alguns meses, você cantou um dueto com Floor Jansen em um festival belga chamado Metal Female Voices Fest. Quais conselhos você daria a ela, em relação à sua nova aventura com o Nightwish?
"Dei a ela os meus conselhos, de fato, e recentemente mantivemos muito contato. Eu a aconselhei que seja saudável, valente e que continue sendo ela mesma. Disse a ela que não permita que ninguém consuma a sua moral. Ninguém deveria fazer isso. Ela deve fazer o que realmente sente como correto.

Você pensa, com base em suas vivências, que existe esse risco no Nightwish?
"Ela tem a sua experiência e eu tenho a minha. Não podemos ainda compará-las, quando as pessoas ao redor são mais ou menos as mesmas, assim é muito difícil dizer."

Parece evidente que ela possui agora laços de amizade com seus atuais companheiros. É de se imaginar que as perspectivas que uma parte ou outra te emitem sejam muito distintas.
"Sim. Ela e eu continuamos conversando, me preocupo muito com ela e desejo o melhor. De verdade, espero que tudo saia muito bem."

Tive recentemente a oportunidade de falar com Anette Olzon e ela me contou que pensa que a razão para sua expulsão do Nightwish foi a sua gravidez. Ela também te mencionou quando confessou que a ela não parecia boa idéia que a banda lançasse o DVD "The End of an Era", no qual você aparece, depois que te despediram. O que você pensa sobre a sua expulsão e dessas declarações?
"É a experiência dela. Tudo o que aconteceu com a banda e comigo foi há muitos anos e quero fazer tudo o que posso para me esquecer deles. Agora tenho a minha vida e minha música, e estou trabalhando nelas melhor do que nunca antes. Não preciso voltar a pensar neles, só o faço quando me perguntam sobre o assunto. Falando da Anette, também estive em contato com ela e desejo a ela todo o melhor, e que se saia muito bem em sua carreira solo. Cada um tem suas próprias experiências, é parte da vida, e estas que são mais desgradáveis nos fortalecem. Sobre a sua expulsão, direi que não posso entender esse tipo de comportamento de modo algum. São coisas que não deveriam acontecer, com certeza."

Então você tem uma relação de amizade com Anette também?
"Não temos esse tipo de relação porque nunca me encontrei pessoalmente com ela. Com certeza eu gostaria disso, porque acho que teríamos muito sobre o que conversar (risos)."

Você com certeza tem uma magnífica rede de contato com grandes vocalistas do cenário. Você participou do último álbum do Within Temptation, cantando com Sharon den Adel em "Paradise (What About Us?)", o que deve ter sido uma ótima experiência. Você gosta muito de duetos?
"Gosto muito mesmo de participar em duetos e de colaborar em geral com diferentes artistas, porque isso sempre te proporciona diferentes pontos de vista sobre como se trabalha como artista. Cada um tem sua maneira pessoal de fazer as coisas e é muito interessante. Sempre que faço meus álbuns e convido músicos como Joe Satriani, que gravou um solo, presto atenção em como gravam, como se preparam, como fazem tudo, que equipamento preferem usar... há todo um mundo de inteligência e experiência para descobrir em cada um deles. Com Within Temptation passei momentos fantásticos, foi fantástico ver como trabalhavam e foi muito divertido quando nos juntamos na Holanda para fazermos juntos o vídeo e a sessão de fotos."

Com quem você gostaria de cantar um dueto e ainda não o fez? Talvez Anette Olzon?
(Risos) Adoraria fazer um dueto com um homem que eu adoro e do qual sou muito fã: Peter Gabriel. Nos encontramos brevemente em uma ocasião e sua voz me fascina, sua presença e a maneira que tem de trabalhar como artista, cuidando até do último detalhe de seus álbuns e produções. É alucinante! Sobre Anette Olzon, não posso dizer que não me veja cantando com ela no futuro, mas não está nos meus planos e não acredito que esteja nos delas, também. Quem sabe o que vai acontecer no futuro...?

Você tem quase os mesmos discos solos que teve no Nightwish. Você acredita que conseguirá ser lembrada por igual como solista e como vocalista do Nightwish, ou que será para sempre a ex-vocalista do Nightwish?
"Está claro que sempre serei a antiga vocalista do Nightwish, estou segura disso, mas realmente espero que minha carreira solo tenha a mesma relevância para o público. Hoje em dia o espectro musical que pratico é mais amplo e posso também chegar a um público maior, porque também faço música clássica e não são só metaleiros que comparecem aos meus concertos. Realmente confio que as pessoas entendam com o meu terceiro álbum que sigo por conta própria, que estou cada vez mais forte neste sentido e que me sinto muito feliz de onde estou e de onde a música está me levando atualmente. O certo é que está me levando a um lugar muito no confortável no qual tenho confiança."

É difícil conciliar seu trabalho como musicista profissional e o seu novo compromisso como mãe?
"Olha só, minha filha acordou há quinze minutos. Estivemos conversando todo esse tempo e ela não fez sequer um ruído, o seu pai a tirou da cama e agora está lhe dando café da manhã. Assim é a minha vida, estou vivendo com o meu marido, que se ocupa muito de tudo quando não posso e é com ele que viajo e trabalho. Toda a família viaja a todos os lugares e minha filha é genial quando está com outras pessoas, independente de sua cor de pele. Na verdade, isso é que adoro nela, que ela não se assusta com as pessoas e encara muito bem mudanças de ambiente. Deixe-me dizer que é difícul fazer uma turnê de rock e viajar no ônibus com um bebê a bordo, mas é algo possível de ser feito e estou cercada de boas pessoas que me ajudarão quando for necessário."