A cantora e compositora de heavy-metal Tarja Turunen, ou simplesmente Tarja, lançará seu sétimo álbum de estúdio, intitulado “In The Raw”, 30 de agosto, pela EarMusic.
Encontramos a soprano finlandesa em Londres para conversarmos sobre o processo de criação.
RAMzine: O novo álbum é ambientado em cavernas, sombras, desconhecido...tudo isso soa muito isolado. Você é uma pessoa solitária?
Tarja: Não...talvez eu seja, por ser artista. Há um ditado que diz “se você tem um amigo verdadeiro, então é uma pessoa abençoada. Se você tem dois, é sortudo; se tem três, é mentiroso.” Acho que preciso da solidão, por causa da arte.
Acredito que você precisa sentir dor para criar música. Nesse álbum, particularmente, senti que estava trabalhando sozinha, por conta própria; em comunhão com minha alma. Foi um processo pelo qual eu sabia que tinha que passar. Percorri uma longa estrada e aprendi muito, acho que agora estou mais segura. Talvez você consiga perceber isso no álbum. Há outra palavra: naturalidade. Sou eu, apenas eu me olhando no espelho, encarando meu passado e vendo porque sou a pessoa que sou hoje.
RAMzine: Foi uma catarse? Você se sentiu mais pura depois da gravação?
Tarja: Sim. Também me senti muito cansada, exausta por causa das emoções. Parecia que eu nunca mais conseguiria escrever uma música, mas quando a energia começou a fluir novamente, foi lindo. De certa forma, esse álbum foi um parto.
RAMzine: Então, você está encarando a si mesma? Como você se enxerga? Sob uma luz diferente?
Tarja: Estou em um caminho de aprendizagem, comecei essa jornada com meu último álbum, “The Shadow Self”. Estou me descobrindo. As coisas têm acontecido para mim, estou saudável. Aconteceram algumas coisas que me deixaram balançada e me fizeram perceber que não podemos perder tempo. Soa como um cliché, mas é bastante real. Quando você percebe que talvez não tenha muito tempo...
Quando esse tipo de coisa acontece (eu perdi minha mãe para o câncer), fica claro que você tem que usar seu tempo da melhor maneira possível. Então, quando olho para mim e penso sobre o álbum...me sinto tomada por maus pensamentos ou pela insegurança que sentia no início. Agora, com as coisas claras, me sinto forte novamente.
RAMzine: Conte-nos sobre as cavernas. Por que você se pôs em locais escuros?
Tarja: Fui à caverna St. Michael’s porque fica a algumas milhas da minha casa. Corro cinco ou seis vezes por semana pelos campos e montanhas com meu esposo. Gostamos de sair com nossa filha, nós amamos, mas as cavernas...são como uma viagem de autodescobrimento. É como quando você vê o que há no seu interior. É meio assustador. Talvez você consiga perceber porque reagiu de certo modo, porque as coisas deram errado ou porque aconteceram de certa forma, ou porque você ficou tão chateada com uma coisa ou outra. Os questionamentos surgem em ambientes sombrios. A caverna é algo simbólico. O símbolo de olhar para si e descobrir as respostas dos porquês.
RAMzine: Você acredita em Hades?
Tarja: Err...eu duvido. Talvez. Não. Mas sei que a caverna tem outros níveis. Gostaria de conhece-los, de ir mais fundo...
RAMzine: Fale-nos sobre Dead Promises, com Bjorn Strid
Tarja: Escrevi essa música com Alex Scholpp, meu guitarrista. Quando sentei para compor a música com ele e disse que queria algo que fizesse as pessoas pularem, que mostrasse a força da banda: baixo, bateria e guitarra. Há uma parte operática (gosto de acrescentar quando posso), porque é uma música poderosa e eu precisava disso. Eu queria aquela naturalidade novamente. Quando terminamos a primeira demo...é uma história sombria, com luz no final do túnel (de volta aos túneis). Alex conseguiu fazer isso, dar poder à música.
RAMzine: Fale-nos sobre Goodbye Stranger, com Cristina Scabbia [Lacuna Coil].
Tarja: é outra música apenas com guitarras e bateria. É algo muito raro para mim, porque minhas produções normalmente têm orquestra e teclado. Nessa, eu achei que precisava do apoio da banda, porque ela parece um chute. Vocalmente, percebi que sou muito mais poderosa do que era há alguns anos, porque tenho treinado bastante. Sinto que tenho poder e energia, mas preciso da banda comigo. É como se eu pensasse “se eu cair, eles me seguram”. Então, essa música, goodbye stranger, é apenas com guitarra, o que a deixa bastante atmosférica (novamente, escrevi essa música com o Alex). Ele é o principal compositor comigo...
RAMzine: Fale-nos sobre spirits of the sea, dedicada à memória do ARA San Juan. Os músicos argentinos que trabalham com você te influenciaram?
Tarja: não, foi algo que veio de mim. Não esqueça que morei na Argentina por mais de dez anos. Quando isso aconteceu, mexeu com todo mundo. Foi algo muito triste. Eu quis fazer isso pela equipe. Fiz com Bart Hendrickson (ele é engenheiro nos estúdios Hans Zimmer, em Los Angeles). Somos amigos desde meu primeiro álbum e mantemos contato. Ele é um cara sombrio, é baterista e compõe para filmes, então ele entende meu background na música clássica. Ele tem estado mais profundo e sombrio que nunca. Escrevi a letra para a música em um dia, porque estava bastante inspirada por pensar que as almas nunca se perdem, elas permanecem para sempre...
RAMzine: Contos folk surgem para você com facilidade?
Tarja: Não muito. Tenho familiaridade com ashrays (sereias crianças da noite). Escrevi essa música porque senti que tinha um filme no meu interior. Escrevê-la com um compositor de filmes fez com que ela parecesse ainda mais com um filme. Pensei que precisava me dirigir a esse lugar...profundo, bem profundo, na escuridão, no completo silêncio.
RAMzine: Fale-nos sobre Silent masquerade.
Tarja: Ela foi feita com Tommy [Tommy Karevik, do Seventh Wonder / Kamelot], mas eu a compus há algum tempo. O piano é meu instrumento e eu gosto de fazer riffs nele (eu toco um pouco de guitarra, mas não sei fazer riffs). Para mim, é fácil fazer isso; é poderoso e melancólico. Piano é um instrumento que me inspira. Essa música veio de uma história muito triste, relacionada a minha família e amigos pessoais. Nesse álbum tem coisas muitos pessoais. É uma música bastante orquestrada. Tenho que dizer que chorei feito criança na cozinha, quando Tommy me entregou os vocais. Ele gravou a parte dele sozinho. Conversamos rapidamente pelo Skype, falamos sobre a música e eu disse o que gostaria que ele fizesse, mas como em todas as minhas colaborações, disse que ele poderia ficar livre para se expressar. Gosto de dar espaço às pessoas. De modo contrário, não tem sentido fazer uma música em conjunto. Então, ele me entregou 48 faixas. Enquanto eu as ouvia, chorava. Fiquei tão orgulhosa da gente, do nosso momento.
RAMzine: Você sente raiva das coisas que aconteceram com você?
Tarja: Não, raiva não. Sinto desapontamento, não raiva. Sempre procuro olhar o lado positivo das coisas. Ainda hoje sou inocente, acredito em coisas boas. Fico muito afetada quando sou desapontada, mas não, não fico com raiva. Seria demais.
RAMzine: Como você cuida do seu emocional?
Tarja: Bem, cantar é minha válvula de escape. Todo mundo, seja criador ou consumidor, é curado pela música. Poder trabalhar com música faz com que eu me sinta privilegiada. Novamente, é uma bênção. Eu também corro, vejo a natureza, o céu azul e os pássaros cantando e respiro fundo. E, claro, quando olho para minha garotinha correndo, sempre digo a mim mesma “bem, ao menos fiz algo bom nesta vida...ela tem seis anos”.
RAMzine: Alguma das pessoas que cantam com você no álbum participará na The Raw Tour?
Tarja: Eu vou adorar se eles puderem, mas eles são muito ocupados com as próprias turnês e agendas. Talvez consigamos pensar em algo, mesmo que seja em algum festival ou algo do tipo. A tour será longa. Ela começará em setembro, na Rússia. Depois, América do Sul. Entre esse período, farei concertos clássicos, no natal, em uma igreja na Finlândia, além de outros lugares. Depois, a the raw tour será retomada na Europa, próximo ano. Até então, não viremos para a Inglaterra. Em Janeiro, farei concertos bastante especiais...na verdade, eles são tão especiais que não posso falar a respeito ainda! Em breve, vocês terão notícias interessantes...
Quando termino a produção de um álbum, entro em turnê por dois anos. Fiz isso com todos os álbuns que lancei. Depois, começo a escrever um novo. É sempre um ciclo de 3 anos. No entanto, desta vez, haverá dois anos entre as gravações. É um ciclo sem fim, felizmente.
RAMzine: Felizmente! Parabéns por um novo álbum enormemente satisfatório!